- Autores: Alho A, Kluge U
- Link: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232012000400004
O texto de Tanaka me seduziu pelo seu eco a algumas reflexões que tenho feito ao longo dos últimos cinco anos, iniciadas na 1ª oficina para construção do GT da Abrasco (“Da avaliação em saúde à saúde da avaliação”), e agora revisitadas ao escrever um capítulo de livro sobre “a nova saúde pública”, focalizando a avaliação de desempenho como contribuição ao Plano Nacional de Saúde em Portugal. Portanto, não me incluo como debatedora, visto que não vou destacar controvérsias, mas como defensora desta tese que chamo de uma “meta-avaliação da gestão em saúde”, com foco na utilidade, ou o necessário alinhamento entre a avaliação do desempenho e o desempenho da própria avaliação. Enquanto profissionais comprometidos com evidências e boas práticas nas experiências da gestão das políticas e programas que levem a ganhos de saúde populacionais e redução das desigualdades sociais, a avaliação de desempenho não nos pode deixar indiferentes.
Partimos do pressuposto de que o desempenho refere-se ao grau com que os sistemas de saúde alcançam metas de impacto, se adaptam e geram produtos de qualidade, de acordo com planos estabelecidos e indicadores relevantes, mas também mantendo ou criando novos valores. A estimação desses indicadores pode parecer simples, mas para que traduzam impactos ou efeitos não existe consenso teórico e metodológico, estando sempre no centro das preocupações dos avaliadores, dada a prioridade político-institucional, a complexidade das intervenções e das múltiplas abordagens mobilizadas.
Textos recentes (2010-2011), manuais e guias de avaliação dos organismos internacionais como Banco Mundial e Comissão Europeia, ou de países com maior grau de avanço neste processo (Canadá, França e Inglaterra), mostram a necessidade de se ter dispositivos institucionais, enquanto mecanismos de regulação indispensáveis para se avaliar programas públicos, que orientem a tomada de decisões: avaliação interna ou externa, comitês de pilotagem, perfil de avaliadores, escolha de metodologias e qualidade dos estudos realizados. Na análise desses textos observa-se que a maioria dá preferência a avaliação externa, sem excluir a interna, vendo nesta um instrumento de aprendizagem, onde os gestionários são estreitamente associados ao “por que” e ao “como” de suas atividades. Con-sidera-se também que a autoavaliação e a avaliação independente (externa) são distintas, mas complementares. A necessidade de experiência em avaliação, com um mínimo de credenciais acadêmicas e competências capazes de enfrentar pressões significativas e dilemas éticos, se constituem questões a serem ponderadas, existindo sempre a dificuldade de se conciliar a independência do avaliador e o inevitável envolvimento nos serviços durante o processo da avaliação, para facilitar sua utilidade.
É importante reiterar ainda que, na perspectiva de uma gestão orientada por resultados, a avaliação é uma atividade que tem a vocação de se integrar à gestão pública e ao funcionamento do sistema político, se apoiando sobre a pesquisa avaliativa, mas sem a ela se restringir. O caráter institucional da avaliação supõe também definir formalmente as responsabilidades respectivas dos comanditários ou comissionários (quem encomenda ou gerencia os estudos de avaliação), avaliadores e usuários, de modo que possam se apropriar dos resultados dos conhecimentos produzidos e integrá-los à sua própria visão da realidade. A decisão de institucionalizar a avaliação em âmbito da gestão nacional, regional, municipal ou local significa integrá-la em um sistema organizacional no qual seja capaz de influenciar seu comportamento, através dos seguintes requisitos operacionais:
- Inserção organizacional, propósitos e recursos atribuídos (estrutura);
- Abordagens contratuais e metodológicas (práticas avaliativas);
- A relação estabelecida entre a gestão e a tomada de decisão (utilidade).
Assim, a maneira como o monitoramento e avaliação são organizados nos diversos níveis do sistema, de modo a atender esse mínimo de requisitos exigidos, terá um impacto significativo nos tipos de estudos que são conduzidos e utilizados. Embora se considerando inevitável que estas duas atividades estejam intimamente relacionadas, há consenso de que é necessário distinguir a natureza da avaliação e do monitoramento. Este último é definido como uma prática gerencial de acompanhamento das intervenções, que permite uma apreciação continuada dos programas governamentais de modo a prover a administração de informações sintéticas, mas dispensam a necessidade de avaliadores, os quais necessitam de competências diferenciadas de investigação ou pesquisa. Se as concepções de institucionalização da avaliação são inúmeras, a construção de uma cultura avaliativa, que faça do uso da avaliação parte integral das operações de uma organização ou sistema de saúde, é consensual. O efeito esperado de sua adequada implementação, tem como principal determinante o fortalecimento da capacidade avaliativa de todos os actores envolvidos, através de processos formais e continuados de aprendizagem, em que erros e falhas, resultantes de inovações ou experimentos com vistas a melhores resultados, não são punidos e sim computados como lições aprendidas.
No entanto, qualquer proposta desta natureza demanda um trabalho colaborativo com diversas instâncias (inter)nacionais, ministeriais, regionais e locais, incorporando outras experiências. Elas possibilitam ampliar a credibilidade, a aceitabilidade e a utilidade da avaliação do desempenho, identificando intersecções entre áreas de políticas públicas, de modo a orientar a articulação intersetorial e a atuar nos determinantes da saúde, reforçando a noção da “saúde em todas as políticas” e uma cidadania responsável. Além de aspectos relacionados à eficiência e à efetividade das ações, já destacados por Tanaka, a avaliação deverá ser instrumento para aumentar a equidade no acesso e na utilização de serviços, a qualidade da atenção ofertada, a satisfação da população, a igualdade de oportunidades de captação e a alocação de recursos para financiar o sistema, contribuindo para uma mais valia em saúde através de serviços sustentáveis e reforçando os mecanismos de segurança social na doença.
À guisa de conclusão podemos dizer que, se já existe amplo consenso quanto à ideia de que as políticas públicas devem ser acompanhadas de avaliações sistemáticas, como parte da rotina governamental, adaptando-se continuamente em função dos resultados e recomendações por elas fornecidas, esta ideia se traduz na necessidade de se utilizar a avaliação, mas é preciso questionar sempre a sua capacidade em produzir as informações e os julgamentos necessários para ajudar a melhorar o desempenho dos sistemas de saúde (metaavaliação). Por outro lado, o papel dos avaliadores, como facilitadores das mudanças organizacionais desejadas, capazes de convencer os que decidem e as executam, fazendo convergir o maior número de atores, continuará como uma hipótese se também não documentarmos e divulgarmos essa influência e utilização em nossa produção científica nacional e internacional.